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Arquitetos: a GR a u
- Área: 170 m²
- Ano: 2020
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Fotografias:André Scarpa
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Fabricantes: Corian - Dupont, Dalle Piagge, Deca, Metotecnica - Esquadrias - Brase - ACM, Tresuno
Descrição enviada pela equipe de projeto. A vida moderna, com seu dinamismo, nos trouxe a sensação de que a arquitetura privada não consegue acompanhar as necessidades da sociedade e dos indivíduos com suas múltiplas guinadas. A quantidade crescente de divórcios e de famílias com formatos diversos é a prova disso. Não é raro que pouco depois do projeto se materializar, já apareçam novas demandas, numa espécie de busca impossível. As casas com diversos quartos erguidos para acomodar muitos filhos (mas que um dia se mudam de lá), que o digam. A conhecida síndrome do ninho vazio, muitas vezes, vem junto com suites ociosas que, um dia, foram pensadas para adolescentes ávidos por um banheiro só pra eles.
O sobrado, situado na Vila Romana - Lapa, já havia passado por duas grandes reformas. Bastante energia foi gasta para deixar o lugar apto para a vida contemporânea (daquele ano), mas, mais uma vez, uma reforma se fez necessária para ajustar o ambiente à família que crescia e, claro, ao trabalho remoto, que, com a pandemia, levou pra dentro de casa o que antes estava da porta pra fora. O que fizemos neste projeto foi adaptar a casa sem perder de vista que as coisas podem mudar novamente. Não é exatamente um processo de adivinhação, mas de criar ambientes versáteis e adaptáveis sem a necessidade de mais intervenções.
O tempo era curto, havia um bebê a caminho, por isso, precisávamos de assertividade, mas sem deixar de pensar a casa como um todo. Porque nunca se trata de ter, apenas, um quarto a mais. Uma família maior exige mais de todos os ambientes da casa. A família se mudou por três meses, dando agilidade aos trabalhadores e confiou em algumas intervenções propostas que, a princípio, não estavam na lista de prioridades.
O foco da intervenção foi a área íntima da casa, o pavimento superior foi todo reformulado. As reformas anteriores tinham deixado todo este andar com a planta livre, dois dormitórios e somente um banheiro. Aproveitando esta estrutura, fizemos a divisão do espaço com paredes drywall e a construção de uma suíte. A casa passou a contar com três dormitórios, sendo um deles facilmente reversível em sala de tv, escritório ou sala de brinquedos.
Com a reorganização dos ambientes, novas aberturas surgiram e as antigas foram reformuladas. As janelas cresceram e receberam pórticos de concreto pré-moldados com esquadrias de alumínio embutidas. Estes novos elementos banharam os ambientes internos de luz natural e enquadram a vista, tirando proveito da implantação da casa, situada na encosta de uma das abas do espigão central da cidade. Além deste recorte o concreto veio para criar uma linguagem comum com as intervenções anteriores.
Nas áreas social e de serviço, ambas localizadas no pavimento térreo, a intervenção foi pontual. As reformas anteriores já haviam ampliado a relação dos espaços internos com o jardim. Dois pontos foram adicionados agora: a reformulação do lavabo, que cresceu, se tornou mais acessível à entrada da casa e ganhou um vestíbulo, e a criação de uma ampla praça de concreto em meio nível entre a sala de estar e o jardim dos fundos. Antes, quintal e sala ficavam relativamente distantes por conta da escada que separava os ambientes.
Para ampliar as possibilidades de uso, os pilares que sustentavam o pergolado de madeira existente foram substituídos por um pórtico de estrutura metálica, este vazio se transforma em palco para a vida cotidiana da família e este novo elemento qualifica o jardim já consolidado ao longo dos anos de existência da casa. Parte da edícula foi demolida, o que deu respiro ao quintal, preservamos apenas um quarto para usos variados e um vestiário para os dias de banhos de esguicho com as crianças, ou mesmo para que os trabalhadores tenham um lugar privativo para o banho e troca após um dia de trabalho.
O projeto mimetiza as reformas anteriores e traz intervenções que adequam o programa da casa. A história não foi apagada. O resultado ficou atual, equilibrado e, principalmente, versátil para amparar a família, o trabalho e os estudos cada um a seu tempo e com suas demandas tão alteradas pela pandemia. A casa da rua Baré está preparada para um isolamento confortável, mas também para uma grande festa quando tudo isso passar. Ali, cabem bebês com suas demandas incessantes, mas também jovens ávidos por privacidade.
Trago para esta conversa o mestre Le Corbusier, com seu ideal de cidade com divisões claras para as distintas atividades. Cidades onde morar, trabalhar e ter lazer se encaixavam no tabuleiro urbano sem se sobrepor. Em 2020, a crise sanitária fez com que voltássemos no tempo, para uma época pré-Corbusier, onde a casa precisa abraçar todas as atividades, mas sem perder de vista que, ali adiante, seguiremos firmes na crença do maior arquiteto do século 20.